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Seminário de Residências Artísticas: Ponto(s) de Situação

Contextos, mapeamentos e estratégias de programação
19 — 20 MAIO 2022

11h — 18h

Acesso livre, com inscrição obrigatória.

Desde a eclosão dos programas de residência artística como fenómeno global na última década do século XX, tem vindo a confirmar-se a tendência de crescimento e diversificação deste modelo operativo no contexto (inter)nacional. O presente encontro, aberto à participação do público, procura convocar diversas vozes e abordagens, para um debate alargado sobre o panorama das residências artísticas em Portugal, refletindo o caráter multifacetado e polivalente dos diversos agentes e práticas mobilizadas em torno deste modelo.

Partindo de uma perspetiva histórica que permita contextualizar o panorama cultural e artístico português, procura-se ir ao encontro da afirmação contemporânea das residências artísticas, enquanto veículo privilegiado para a promoção da criação artística, mas também enquanto plataforma de intervenção política, económica e social. Nesse sentido, convidámos um conjunto de 12 oradores - investigadores, professores, artistas, curadores e (outros) representantes de instituições culturais - para um debate estruturado em quatro 4 painéis temáticos:

​1. Os artistas viajantes portugueses: da viagem humanista à viagem cultural;

2. Genealogias e antecedentes da Residência artística em Portugal;

3. Criação artística, Património e valorização dos territórios;

4. Perspetivas artivistas: colaboração, intervenção e mobilização.


O seminário terá lugar entre os dias 19 e 20 de maio de 2022, nas Carpintarias de São Lázaro, com o apoio do Centro de Estudos e Investigações em Belas-Artes (CIEBA) - Universidade de Lisboa, Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes (CITAR) - Universidade Católica Portuguesa, Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e Academia Gerador.

​A cada participante será atribuído um certificado de participação.

​PONTO(S) DE SITUAÇÃO insere-se no vetor de programação "Gostaríamos de acrescentar" das Carpintarias de São Lázaro.

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SESSÃO DE ABERTURA | 19.05

​11h30 — Carpintarias de São Lázaro: residências artístcas
Fernando Belo


11h45 — Da arte ao património, do património à arte e assim por diante
Laura Castro

Breve reflexão sobre o modo como se relacionam arte e património, entendidos como práticas, entidades, instituições culturais que vivem em convergência, sobreposição, desafio, confronto, oposição, validação, estímulo. Quando a arte habita o património e o património habita a arte surgem como abrigos intermutáveis.


12h00 — Breves anotações para pensar a Residência Artística
Susana Gastal

Falar em <residência artística> supõe considerar, além do artístico, movimento e locus. O primeiro supõe a questão do deslocamento. O segundo reporta à mudança temporária de lugar. Se teóricos incluem como “residência artística”, por exemplo, a estada de Leonardo da Vinci no Vale de Loire, a convite, para ali criar livremente (Batista, 2008), a questão acirrou-se no contexto da arte contemporânea, com propostas em termos de mecenato privado e de políticas públicas. Postas estas considerações, o presente propõe trazer à discussão a Feira Anual de Artes Plásticas, promovida na cidade sul brasileira de Rio Pardo, durante a Semana Santa. Se nas primeiras edições (1974-1975) a presença de grupos de artistas se restringia a quinta e sexta-feira, em anos que se seguiram aumentou o número de dias de presença na cidade, ali realizando trabalhos nas técnicas de desenho, pintura e gravura.


​12h15 — Das deslocações e das fixações dos artistas – porquê as residências?
Fernando Rosa Dias (FBAUL/CIEBA)

Ao longo da história da arte sempre houve uma dialéctica entre a fixação do artista num lugar de trabalho, num estaleiro de construção ou num atelier, ou de deslocações, em função de trabalho, de formação, do prazer da aprendizagem da viagem, entre outras. Através de breves exemplos desta vasta dialéctica, mais completar que tensa, abordaremos algumas razões da necessidade actual das residências artísticas.


12h30 — Lançamento Convocarte N.º 14/15: ARTE E MOBILIDADE: Eppur si muove!breves exemplos desta vasta dialéctica, mais completar que tensa, abordaremos algumas razões da necessidade actual das residências artísticas
Fernando Rosa Dias (FBAUL/CIEBA), Susana Gastal (UCS) e Bruna Lobo (FBAUL/CIEBA)


12h45 — Publicação do Seminário de Residências Artísticas: Pontos de Situação Contextos, Mapeamentos e Estratégias de Programação
Diogo Freitas da Costa (FBAUL/CIEBA)


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KEYNOTE | 19.05

14h — O hóspede estrangeiro. Os Artistas Residentes nas escolas do Plano Nacional das Artes
Paulo Pires do Vale

Qual o lugar das artes e do artista na escola? A partir do filme de Pasolini, "Teorema", tentarei dar algumas respostas a esta pergunta, explicando o que propomos com a medida "Artista Residente" do Plano Nacional das Artes.

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PAINEL 1 | 19.05

​14h30 — Os artistas viajantes portugueses: da viagem humanista à viagem cultural
Moderação Bruna Lobo

O conceito de residência artística é contemporâneo. Apesar disso, sabemos que em tempos anteriores existiam organizações, como as bolsas e Academias de Arte, que já semeavam práticas similares. Nesse sentido, o resgate histórico pode ampliar as noções sobre características inerentes às Residências Artísticas, para além da sua inclinação formativa, mas apontar para questões fundamentais relacionadas com a criação e o deslocamento. Essa proposta não considera essas viagens como antecipações das Residências Artísticas, mas práticas sociais que enriquecem a compreensão do movimento de artistas para residências no cenário contemporâneo.

— Manuel San-Payo: Desenho e Distância; o Caderno de Viagem

O desenho, registo da transitoriedade e do efémero, é, em si mesmo, movimento.
O artista/desenhador e a mobilidade social. Arte e círculos de poder e a sua circulação. Confrarias e oficinas. Cadernos de Padrão e de Modelos: a busca do cânone. Ver sem ser visto: o estrangeiro e a fronteira. A viagem filosófica, Impérios e Colónias (o distante exótico). Grand Tour, turismo industrial e turismo de massas. O caminho do artista tornado mercadoria.

— Maria João Castro: O estrangeiro visto pelos portugueses viajantes da Belle Époque

O grande movimento de viagem de lazer ocorrido no século XIX chegou tarde a Portugal, muito por influência das vicissitudes geopolíticas da primeira metade de Oitocentos e de que se destaca as invasões francesas e o consequente refúgio da corte portuguesa para o Brasil, bem como a guerra civil liberal subsequente. Nesta atmosfera cambiante, a dimensão do estrangeiro tornou-se, para os nacionais, num imperativo mais desejado e cantado do que vivido, pelo que, só quase no fim do século se reunirão as condições necessárias para alguns portugueses fazerem as malas partindo além-fronteiras. Por outro lado, as viagens internas foram pouco promovidas mercê de uma sociedade pouco esclarecida, pobre, bem como da tardia implantação do comboio, da falta de estruturas de apoio (rodoviárias, hoteleiras e de lazer) e de uma iliteracia generalizada que impedia a concretização de deambulações viáticas no seio do próprio país. Por isso, os viajantes foram raros e os seus testemunhos (literários, artísticos) ainda mais escassos, facto que faz com que os existentes constituem um precioso legado para se (re-)pensar a Belle Époque portuguesa. Estes, interessam sobretudo não tanto pelo testemunho da sua deambulação pelo mundo mas sobretudo sobre o que disseram de si próprios através do olhar do “outro”. Esta reflexão pretende assim realçar a singularidade de algumas destas viagens inserindo-os à luz do contexto cultural-artístico da sua época numa Europa então em completa mutação mas cujos ecos e derivas tardavam em chegar à ponta ocidental do Velho Continente.

— Mário Linhares: Sketch Tour Portugal

Viajar e desenhar ou viajar para desenhar?
Nesta comunicação apresenta-se o projeto Sketch Tour Portugal, concebido e implementado em parceria com o Turismo de Portugal e os Urban Sketchers. Para que o tempo da viagem se fundisse com o da visita no destino, procurou-se uma vertente holística na captação dos sentidos. Além de um diário de viagem com desenho e escrita, registaram-se também paisagens sonoras, imagens em vídeo e fotografia, proporcionaram-se degustações gastronómicas, assim como a recolha de vestígios geológicos.
Nem todas as pessoas viajam e desenham. Menos são ainda as que viajam apenas para desenhar. Mas qualquer viajante sente vontade de registar algo e, sem saber, deixa também o seu registo, nem que seja o da pegada carbónica.

— Michela Degortes: Em Roma sê romano. A viagem, residência e estratégia social dos artistas na capital cosmopolita das artes entre Setecentos e Oitocentos.

O sentimento de sublime exaltação face ao encontro com Roma, capital do mundo clássico e meta de viagem para artistas e intelectuais, foi sugestivamente expresso por Johann Wolfgang Goethe em 1786: «Não estou aqui apenas por simples deleite; quero mergulhar no estudo desta magnificência, quero, antes de ter quarenta anos, instruir e cultivar o meu espírito». Com o mesmo entusiasmo e com o objetivo de aperfeiçoar a própria aprendizagem deslocavam-se a Roma artistas de todas as proveniências, inclusive os portugueses, vindo consolidar uma tradição que alcançou o seu ápice entre finais de Setecentos e o primeiro quartel de Oitocentos. Estes não iriam mergulhar apenas na magnificência enfatizada por Goethe, mas também num ambiente cosmopolita onde se cruzavam culturas, línguas e trajetórias artísticas diferentes, um contexto inspirador e criativo, mas também caracterizado por uma feroz concorrência. Este breve contributo propõe um olhar sobre as dinâmicas da residência dos artistas em Roma entre Setecentos e Oitocentos, procurando destacar os elementos da sua sociabilidade e as estratégias na aproximação a mecenas e compradores.

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PAINEL 2 | 19.05

16h45 — Genealogias e antecedentes da Residência artística em Portugal
Moderação Diogo Costa

Do mesmo modo que o modernismo, nas suas sucessivas vanguardas, foi dominado pela projeção para um tempo futuro e pela operacionalização do conceito de ruptura, pode dizer-se - na esteira de uma análise proposta por Hal Foster (1996) - que a arte contemporânea, na sua viragem do “discurso em torno do médium para os projetos centrados no discurso” (1996:xi), tem-se visto frequentemente enredada num presentismo sempiterno, de alguma forma quebrando uma coordenação crítica entre os eixos diacrónicos – ou dimensão histórica - e sincrónico – ou dimensão social – da arte. Esta perspetiva ajuda-nos a compreender o motivo pelo qual uma parte dos debates e discursos construídos em torno do modelo da Residência Artística, tal como se tem afirmado ao longo das últimas três décadas, têm evidenciado resistência a leituras centradas em fenómenos de continuidade e na identificação de genealogias. Este painel propõe, precisamente, contribuir para uma contextualização do fenómeno contemporâneo das residências artísticas em Portugal, ancorada num olhar retroactivo que – ao invés de um exercício negativo de retroversão - se possa constituir como elemento de aproximação e exponenciação de uma situação atual.

— Bernardo Pinto e Abreu: Pico do Refúgio - Residência de Artistas

O programa de residências artísticas do Pico do Refúgio teve início em 2015 numa quinta com cerca de 400 anos, localizada na ilha de São Miguel, nos Açores. O Pico do Refúgio, serviu, desde então, como plataforma criativa para dezenas de artistas das mais distintas áreas e nacionalidades. Perpetuando o passado artístico deste local, especialmente durante o período em que a quinta foi residência da escultora, e professora, Luísa Constantina, o programa é dedicado a apoiar artistas nacionais e estrangeiros nas suas pesquisas e trabalhos nos Açores, promovendo a criação e a difusão da arte contemporânea. Através dos seus artistas residentes e das suas obras, este programa tem alcançado também o objetivo de promover os Açores pelo mundo, como um local onde a natureza, a sustentabilidade e o património cultural convivem com uma dinâmica artística emergente e próspera.

— Isabel Nogueira: Os anos 70 em Portugal: Modernidade, eventos colectivos, Revolução, neovanguarda

Os anos 70 em Portugal são assinalalos pela Revolução de Abril de 1974, que pôs cobro a 48 anos de ditadura. Do ponto de vista artístico, verificava-se já uma clara modernidade, operada por artistas que desejaram ser inequivocamente modernos, independentemente da sua condição geopolítica e cultural. Por outro lado, verifica-se também um cruzamento entre as tendências artísticas da neovanguarda internacional que, entre nós, também se afirmavam, com uma arte que reflecte sobre a Revolução e que a espelha. Ao mesmo tempo, toma corpo um conjunto de eventos colectivos relevantes e que seria também uma tónica da década, fazendo antever vários modos de agregação artística. Esta comunicação centra-se nos anos 70 em Portugal, fazendo uma breve reflexão sobre o cruzamento destes aspectos definidores de fundo.

— João Paulo Queiroz: Os caminhos de uma viagem: as residências artísticas em perspetiva

Do Grand Tour aos pensionistas das academias, dos ar-livristas aos bolseiros do século XIX-XX, até às intervenções mais contemporâneas junto de comunidades, há instantes de reflexão e fulgor que reposicionam o artista no território. Podem-se propor linhas de construção e articulação dos discursos, ontem como hoje, em confronto com a viagem e o território nos contextos atuais.

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PAINEL 3 | 20.05

11h — Criação artística, Património e valorização dos territórios
Moderação Ana Gago

Em “Ten Principles of Values-Based Heritage Practice” (2019), Kate Clark destacou o crescente número de vozes, e de práticas, em torno dos Estudos do Patrimônio, provenientes de origens diversificadas, incluindo “arquitetos e topógrafos, curadores, planeadores, arquivistas, ecologistas”, entre outros. Inúmeros simpósios internacionais, projetos de investigação e/ou artísticos foram já dedicados a explorar as potencialidades, por exemplo, nos cruzamentos entre criação artística e educação patrimonial, demonstrando que os artistas poderiam, de forma inegável, ser adicionados a esta lista cada vez maior de praticantes do património.

Nesse sentido, os programas de residência artística parecem oferecer uma oportunidade para convocar os artistas a (re)interpretar o património, incentivando abordagens interdisciplinares e participativas. No contexto (inter)nacional, as residências artísticas de base patrimonial são, de facto, uma tendência crescente, colocando o património imaterial como leitmotiv preferencial para a criação artística e incorporando um elevado grau de interdisciplinaridade associado a este tipo de iniciativas, incluindo práticas limítrofes às das indústrias criativas.

Neste painel iremos abordar este fenómeno particular, a partir de exemplos concretos de programas de residência artística, desenvolvidos em contextos e com intervenientes muito distintos, ainda que tendo como motivo objetos e práticas enquadráveis do ponto de vista patrimonial (ainda que, quase sempre, não-classificadas).

De que forma pode a criação artística contribuir para fenómenos de patrimonialização, associados, por exemplo, a estratégias de promoção dos territórios? De que forma pode contribuir para contrariá-los? Podem os artistas trazer novas leituras (e novas práticas) do património?

— Álvaro de Brito Moreira & Samuel Silva: Deslocações — Residências artistico-pedagógicas

​O projeto de residências artístiscas e pedagógicas Deslocações, como o nome sugere, procura proporcionar um lugar/momento temporário de encontro entre o contexto museológico, o Museu Internacional de Escultura Contemporânea | Museu Municipal Abade Pedrosa de Santo Tirso e o meio educativo, a Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, através da transferência temporária do espaço de aula para o museu ou outras realidades patrimoniais relacionadas. Este movimento introduz um processo de desinstalação e de reconfiguração funcional dos processos de trabalho dando lugar à construção de novas experiências: os estudantes vêem-se confrontados com a possibilidade de enfrentar um espaço repleto de significados transportando os seus sistemas introspetivos de criação para o confronto com o contexto museológico, arquitetónico, histórico, social, político e territorial; o Museu e a sua equipa vêem-se habitados por novas presenças transformadoras das suas dinâmicas e rotinas quotidianas configurando um momento privilegiado de aprendizagem e interação, relevante para o desenvolvimento das suas aptidões e capacidade de resposta e adaptação.

— Andreia Garcia: Alianças entre seres humanos, gerações, espécies e saberes para salvar o futuro.

A comunicação foca-se na primeira edição da Bienal Art(e)facts que nasceu da ideia de criar colaborações entre artistas, arquitetos e designers, portugueses e estrangeiros, com artesãos da região da Beira Interior. O intuito será apresentar este modo de cuidar a memória imaterial do território a partir de diálogos para a construção de um património contemporâneo de obras e processos de conhecimento artístico, com enfoque na valorização da região e na reinterpretação dos saberes tradicionais, de forma profundamente enraizada no território, e numa constelação de práticas e imaginários que instigam todas as gerações a pensar um planeta hoje mais habitável.

— Lara Seixo Rodrigues: Corpus Cultural Interior: identidade como matéria prima

— Raquel Belchior: Pelos que andam sobre as águas do mar. Um projecto itinerante pelas comunidades piscatórias

Fazer um projecto é como entralhar uma rede. Aliás poderíamos descrever todo um processo de criação artística recorrendo a metáforas piscatórias. Será por que com os pescadores, os artistas partilham esta capacidade de resistência face a um mar nem sempre afável? Alguém nos dizia na borda d´água: a pesca é uma questão de fé...
A rede que caracteriza Pelos que andam sobre as águas do mar é feita de malha literária e comunitária, de nós viajantes, feitos de encontros, escuta e presença.
Quando esticamos bem o cabo observamos os pequenos laços que a compõem e que são todos os territórios por onde a rede passou, das docas aos palcos municipais, das festas religiosas à beira rio às salas de ensaio onde as palavras de Brandão e a pesquisa etnográfica se cruzaram. Este foi um projecto itinerante, que colocou no mesmo barco pessoas e instituições muito diversas, e que só foi possível nesse esforço partilhado.

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PAINEL 4 | 20.05

14h — Perspetivas artivistas: colaboração, intervenção e mobilização
Moderação Ana Gago

Os artistas têm, cada vez mais, vindo a ser propostos como mediadores, para as comunidades locais e, desta forma, contribuindo para múltiplas agendas (políticas); desde a promoção da participação cultural até à promoção (cultural) dos territórios.

Neste painel, iremos centrar-nos na realidade portuguesa, analisando diferentes exemplos de práticas artísticas e, mais especificamente, de programas de residência artística, compondo uma perspetiva sobre o desenvolvimento de abordagens participativas e artivistas, desde os anos 1970 até aos dias de hoje.

Qual a importância de estar para criar mudança? E que mudança?


— Hugo Cruz: Práticas Artísticas e Participação no contexto da programação cultural

As práticas artísticas com enfoque na dimensão participativa têm vindo, em especial nos últimos anos, a configurar-se como um território que reúne um interesse crescente, traduzido numa produção diversa e intensa, prática e teórica. Este movimento desenvolve-se em diferentes geografias e tem sublinhado como aspeto central a sua hibridez epistemológica e metodológica, integrando contributos de distintas confluências disciplinares. A construção destas práticas artísticas tem acontecido num duplo sentido: se por um lado a criação artística contemporânea tem aprofundado a sua dimensão participativa, por outro a educação e a intervenção comunitária e social têm recorrido às linguagens artísticas como alternativa às abordagens mais convencionais. Esta tendência, para além da criação, expandiu-se para o contexto das programações culturais exigindo a ativação de dispositivos e estratégias específicas, nomeadamente na conexão estabelecida com a participação cívica e política.

— Luís Gomes da Costa: Encontros improváveis com a vida comum

Há muito tempo atrás, em meados dos anos 70, quando ainda não havia eletricidade em muitas aldeias serranas da Beira Alta, era comum ouvirem-se histórias improváveis contadas por anciãos. Essas histórias incluíam as andanças de personagens locais dissidentes como mendigos, músicos errantes, agricultores cegos, bruxas misteriosas, padres diabólicos e gente que voltava do reino dos mortos para verificar suas propriedades. De certa forma, essas histórias e o poder estar perto de pessoas que viviam essencialmente da mesma forma de como se vivia dois séculos antes, colocam em evidência características humanas presentes em contextos rurais, como ser-se engenhoso, empático, franco e livre para imaginar e compartilhar ideias e histórias não ortodoxas, numa permanente consciência da fragilidade da vida e da presença duradoura do passado e da natureza em redor das suas comunidades. Estamos, portanto, num plano um pouco diferente do que hoje se designaria por património cultural, uma escolha e redução da complexidade social e cultural dos lugares a alguns aspetos com valor transacionável para além das fronteiras dos contextos socioculturais específicos.
Muitos anos depois, em 2006, decidimos fundar a Binaural Nodar, um projeto de acolhimento e criação artística e de investigação social em contexto rural. De certa forma, começar a convidar artistas experimentais internacionais para trabalhar e interagir com o contexto local e, mais importante, com as comunidades locais, constituiu uma humilde homenagem às gerações de dissidentes que viveram e vagaram por aldeias remotas beirãs, assumindo em simultâneo que a arte ainda é uma das poucas áreas da atividade humana onde as idiossincrasias e as ideias “estranhas" podem ser aceites e compreendidas. Concretamente, com o projeto de acolhimento de residências artísticas Lafões Cult Lab parte-se, entre outros aspetos, de uma identificação de contravalores presentes em contextos locais que se distanciam de um certo otimismo progressista baseado na mudança tecnológica e no crescimento económico infinito, fazendo-o através de uma prática curatorial que identifica temáticas e lugares de investigação, questionando algumas tensões bem atuais, como entre permanência e mudança, entre artista e comunidade, entre local e global, entre perene e efémero, entre manual e intelectual, entre prático e poético, entre racional e irracional, entre compreensão e mal-entendido, etc.

— ​​Rui Mourão: Contrarrepresentações à musealização de corpos humanos indígenas: Da residência artística ao sítio na internet

Apesar de um crescente debate público, muitos museus europeus continuam a deter nas suas coleções objetos de outras culturas adquiridos em contextos coloniais. Esta é uma história com quase dois séculos, frequentemente longínqua das agendas institucionais, porém o movimento pela descolonização dos museus parte da premissa de que o passado ainda não acabou. O passado é pensado como um campo contestado, cuja interpretação foi historicamente decidida por alguns em detrimento de outros. Tratando-se o museu de um dispositivo que constrói e naturaliza representações, nunca poderá ser um espaço neutro. É moldado por relações de poder.
Neste contexto, o projeto O TEMPO DAS HUACAS partiu de uma residência artística no Museu Arqueológico do Carmo, mas continuou de forma não-institucional com um processo de questionamento artístico, científico e ético sobre a exposição de corpos mumificados de pessoas indígenas nesse museu. Reuniu colaborações críticas, propostas de diálogo e contrarrepresentações que abrem uma pluralidade de perspectivas de pensadores, profissionais dos museus e artistas (com destaque para artistas contemporâneos indígenas). O resultado foi reunido num sítio na internet que é simultaneamente espaço de exposição e arquivo, fórum e palco, reflexão e artivismo.
Em suma, O TEMPO DAS HUACAS convida a um olhar não musealizado ao museu que reflita sobre corpo(s), imagem(ns) e narrativa(s) na sua complexidade, diversidade, intersubjetividade e interculturalidade. Começa por reconhecer desequilíbrios historicamente construídos para imaginar como podem ser tecidos novos modos de relação, dentro e fora dos museus, com a arte e na vida.

— Virgínia Fróis: Desformatar: para criar uma rede de possibilidades

Como é que as aprendizagens em contexto informal se constituem como aprendizagens flexíveis e se estabelecem como processos evolutivos ao longo da vida?
Para além da formação académica destes alunos quais as implicações destas experiências na sua vida profissional atual? Abordaremos três exemplos de atividades realizadas em regime de residência com alunos da FBA.UL.
- 1: Do Projetar Rio para a Mala com pés em Cabo Verde em Trás os Montes no município do Tarrafal de Santiago trabalho com a escola em 2006 e em 2008;
- 2: Telheiro / Oficina de cerâmica: um anel em construção 2011;
- 3: Guizos / Bienal Internacional de cerâmica de Aveiro 2019.

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Comissão Científica

- Fernando Rosa Dias: Professor Auxiliar, Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas Artes;

- Laura Castro: Professora Assistente, Universidade Católica Portuguesa, Escola das Artes. Investigadora do Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes (CITAR);

​- Susana Gastal: Professora Titular na Universidade de Caxias do Sul;

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Comissão Organizadora

- Ana Gago: Bolseira de Investigação FCT (SFRH/BD/148865/2019) no programa de Doutoramento em Estudos de Património, no Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes, Escola das Artes, Universidade Católica Portuguesa;

​- Bruna Lobo: Doutoranda em Artes (Especialidade Ciências do Património) Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas Artes, investigadora colaboradora Centro de Investigação e Estudos em Belas-Artes (CIEBA) Lisboa;

- ​Diogo Freitas da Costa: Bolseiro de Investigação FCT no programa de Doutoramento em Artes (Especialidade Ciências do Património) Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas Artes; Investigador convidado do Centro de Investigação e Estudos em Belas-Artes (CIEBA);

- Fernando Belo: Diretor das Carpintarias de São Lázaro.

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